Editar a Vida
- Dr. Thiago Pontes

- 22 de mar.
- 4 min de leitura
Minha querida leitora, meu caro leito, pelo título deste capítulo podemos ter duas interpretações, a primeira nos parece bem interessante no que diz respeito a uma mudança em alguma área de nossa vida, principalmente no tocante aos resultados obtidos contrariando as expectativas, a segunda interpretação é a que realmente nos interessa aqui. Posso contar com sua companhia para juntos refletirmos sobre esse tema? Maravilha; então, vamos lá!
Pois bem, o título é bem sugestivo: editar a vida. Quando pensamos em editar, me vem logo a mente um ajuste advindo de algum programa digital, para que, com ele, se possa melhorar algo que fora feito, um documento, por exemplo, algum texto com possíveis erros, este livro mesmo passará por tal acerto, por um reajuste de gramática, de edição, de erros da língua portuguesa, há quem ainda utilize da ação de editar para que algo no que diz respeito a redes sociais seja melhorado.
A melhora advém de um ideal, a idéia de perfeição vem desde os gregos cujo principal nome da filosofia é Platão, esse pensador tem uma teoria maravilhosa e que didaticamente a expôs a nós com a famosa alegoria da caverna, que basicamente retrata pessoas em uma caverna escura virados para uma parede e nesta parede enxergam apenas sombras de tudo àquilo que se passa lá na entrada da caverna, ponto único de iluminação. O que Platão quer dizer com tal alegoria? O que isso tem a ver com o ideal? Tais homens dentro da caverna enxergam sombras, imperfeitas, distorcidas, erradas, desajustadas, de tudo aquilo que é real e supostamente perfeito de tudo o que se passa fora da caverna. Com essa alegoria Platão nos incentiva a refletir sobre esse mundo no qual tudo é cheio de desajustes, imperfeito, passível de desejo por melhorias, por desejos de perfeição, por um ideal. Acho que cheguei aonde queria chegar, se não cheguei, ao menos tentei.
Quando pensamos em melhorar algo que está aqui entre nós, algo que é real, temos como objeto de referência algo transcendente, perfeito (que está fora da caverna), faz sentido para você? Como disse lá introdução desse capítulo, editar a vida como um todo nas suas diversas áreas pode estar associado a almejar uma vida supostamente “perfeita”, confesso que a meu ver seja algo utópico e frustrante passível de decepção, já que somos seres humanos sujeitos a erros... Ma a intenção é compreensível. Intenção também conceito abordado pelo filósofo alemão Kant que tem uma máxima, o chamado Imperativo categórico: “Faça de tal maneira a almejar que todos os seres humanos possam fazer segundo o que você fez para com todos, incluindo a si próprio”. Segundo Kant, a intenção de fazer o melhor e se tornar um bom cidadão é válida, assim como é válida a tentativa de ser um bom cônjuge, de ser um bom pai ou mãe, de ser um bom funcionário (a), um bom amigo (a) e por aí vai...
Mas e o ideal das redes sociais, onde entra nessa história toda? Entra aqui, na verdade todo o capítulo já serviu de base para tal foco, mas a reflexão direta segue-se a partir de agora: Vivemos em um mundo midiático, um mundo globalizado e digital, mundo em que se você não posta nada você é uma pessoa excluída da sociedade, enxergo isso em minha mãe que não tem computador, não tem celular e nem quer. Eu a admiro enquanto muitos sentem pena dela, os famosos “usuários”... Essa era que entramos a pouco tempo está se perdendo, está segundo uma palavra que criei (processo de neologismo), aliás, muito mais do que apenas uma palavra seria sim um conceito, uma teoria, estamos vivendo e convivendo em uma geração em reformulação, em edição, e aqui adentra o conceito que criei: “desreferenciados”.
Não sei quando você estará lendo esse livro, este capítulo, mas em meados do ano 2021 o mundo passou por uma enorme pandemia com o chamado COVID, pandemia essa que obrigou a população mundial a utilizar máscaras para prevenção de contaminação. Ao tudo ser controlado o uso das máscaras (que durou quase 2 anos) fora desobrigado, e a impressão que ficou é que ainda as pessoas andavam com uma ‘máscara’, mas uma máscara não mais de tecido, mas sim uma máscara de bom cidadão, de uma pessoa ideal, platônica, e muitas dessas pessoas pertencentes a chamada ‘massa’ da sociedade têm como referência grandes influencers das redes sociais que estão amarrados ao marketing digital, onde tudo é perfeito, todos são felizes, sorridentes, ausentes de problemas, onde não se frustram nem choraram, onde não há decepção, onde todos são de ferro (aqui aproveito a deixa e faço menção em um outro livro que tenho cujo título é um questionamento, típico da filosofia: Você é de ferro? Lembre que até eles enferrujam).
A partir dessa nossa reflexão, você minha caríssima leitora, meu querido leitor, se identifica com tal máscara? Faz uso dela? Independente de sua resposta eu sei muito bem que a sociedade em geral cobra sempre a felicidade como um todo, é como se tivéssemos que provar o tempo todo que temos uma vida perfeita, com uma família perfeita, e um emprego dos sonhos, que estamos seguindo a suposta “cartilha da vida”, tal como um roteiro de ‘como se deve viver para ser feliz’, mas isso cansa, isso frustra, isso gera estresse, você sofre, as pessoas que estão ao seu redor sofrem, os poucos amigos que você tem são impactados, você acaba desenvolvendo doenças psicossomáticas por tentar ser perfeito editando a vida para agradar a sociedade, para tentar ser aceita, aceito.
Nunca ouvi dizer ou pude constatar no aumento expressivo de pessoas buscando por psiquiatras, fazendo uso de remédios controlados para insônia, depressão, ansiedade, passando por psicólogos com metodologia tradicional, buscando por terapias alternativas, holísticas, tudo isso almejando editar a vida, buscando pela vida ideal, perfeita, segundo Platão. Ainda segundo esse filósofo vivemos norteados pelo desejo e desejamos aquilo que nos falta, estamos sempre insatisfeitos, insatisfeitas, queremos mais e mais, reconhecimento, elogios, progresso, mas não nos conta de que isso cansa; uns mais rápidos, outros mais demorados, mas o cansaço vem e o emocional paga o preço’. Após nossa reflexão adoraria que você parasse após a leitura deste capítulo e enxergasse se você e as pessoas que você ama estão tal como reféns dessa bolha ideal, se fazem parte desse ideal digital movido por marketing, por manipulação, consumo e lucro. A resposta é você, somente você quem tem sobre a sua postura em sua rotina de vida.




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